Maioria dos ministros considerou que a lei complementar que regula a matéria autoriza a cobrança do diferencial
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que é constitucional a cobrança do diferencial de alíquota de ICMS por empresas optantes do Simples Nacional nas compras interestaduais. Com placar de seis votos a quatro, o julgamento acontece no plenário virtual e deverá ser encerrado nesta terça-feira (11/5).
O diferencial é cobrado pelo estado onde está localizado o comprador da mercadoria e diz respeito à diferença entre a alíquota interestadual, exigida pelo estado onde está o vendedor, e a alíquota interna estadual.
O recurso (RE 970821) foi levado à Corte por uma empresa do Rio Grande do Sul contra decisão do Tribunal de Justiça local que manteve a cobrança do difal. O caso começou a ser analisado pelo plenário em novembro de 2018, mas foi suspenso por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes.
Agora, a maioria dos ministros acompanhou o relator, ministro Luiz Edson Fachin. Para ele, é constitucional o diferencial de alíquota do imposto cobrado pelo estado de destino na entrada de mercadoria em seu território, quando a empresa optante pelo Simples Nacional faz uma aquisição.
No voto, Fachin enfatizou que a matéria é regulada pela lei complementar 123/2006, que criou o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte e autoriza expressamente a cobrança do diferencial. Além disso, o relator frisou que a adesão ao Simples é facultativa, de forma que o contribuinte deve arcar com os ônus e com os bônus decorrentes dessa escolha.
Fachin propôs a seguinte tese: “é constitucional a imposição tributária de diferencial de alíquota do ICMS pelo Estado de destino na entrada de mercadoria em seu território devido por sociedade empresária aderente ao Simples Nacional, independentemente da posição desta na cadeia produtiva ou da possibilidade de compensação dos créditos”.
O voto do relator foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Rosa Weber, Luiz Fux e Nunes Marques. Ao devolver a vista, Gilmar Mendes acompanhou o relator, mas propôs redação diferente à tese: “não viola a Constituição Federal lei estadual que, em operações interestaduais realizadas por empresas optantes pelo Simples antecipa a incidência do ICMS devido no fato gerador subsequente, nos estritos termos do art. 13, §1º, inciso XIII, alínea g, da Lei Complementar 123/2006”.
A divergência foi inaugurada por Alexandre de Moraes. Para o ministro, a Constituição Federal reserva às micro e pequenas empresas um tratamento tributário diferenciado e favorecido. Dessa forma, o diferencial de alíquotas aumentaria a carga tributária desproporcionalmente para os optantes do Simples, o que tornaria a obrigação inconstitucional. Os ministros Roberto Barroso, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandoski e Marco Aurélio acompanharam a divergência de Alexandre de Moraes.
No início do ano, em fevereiro, o Supremo decidiu que os estados não poderão cobrar o difal de ICMS às empresas não optantes do Simples a partir de janeiro de 2022, caso o Congresso Nacional não edite uma lei complementar sobre a questão ainda em 2021.
No recurso julgado agora pela Corte, com foco nas empresas do Simples, os ministros concordaram com Fachin, que apontou que as empresas de pequeno porte optantes do Simples têm regime diferenciado de cálculo e recolhimento dos tributos. Além disso, neste caso, a matéria é regulada por lei complementar, o que justificaria a diferença de posição da Corte nos dois julgamentos.
Para Pedro Grillo, advogado do Brigagão Duque Estrada Advogados, a corrente vencedora “não se atentou para o fato de que a LC 123/06 instituiu recolhimento do difal por contribuintes que não se enquadram na condição de consumidores finais das mercadorias adquiridas, o que viola o art. 155, §2º, IV e VII, da CF/88”.
O advogado explica que “apesar de a Lei Complementar e as legislações estaduais tratarem a referida exação como mera ‘antecipação’ do ICMS devido pelas empresas sujeitas ao Simples Nacional, a análise mais detalhada do tema demonstra que ela não possui essa natureza, pois não há a possibilidade de abatimento do imposto antecipado do devido nas operações seguintes”.
Na análise de Rafael Pandolfo, advogado da Fecomércio do Rio Grande do Sul, amicus curiae no processo, a decisão do STF prejudica pequenos empresários do país sujeitos ao recolhimento de ICMS. O advogado ressalta ainda que a sistemática de julgamento virtual prejudicou os contribuintes e uma análise técnica do tema pelo Supremo.
“Na sessão presencial, em 2018, foram proferidos quatro votos favoráveis [aos contribuintes] e um contrário. Na sessão virtual, com exceção do Ministro Marco Aurélio, todos votaram favoravelmente à Fazenda”, afirmou o advogado. “No plenário virtual não há debates, mas uma sucessão de monólogos que prejudica claramente a jurisdição constitucional”, conclui.
Segundo o tributarista Allan Fallet, sócio do LTSA Advogados, uma parte da doutrina já tratava de uma possível “batalha” entre os princípios da livre concorrência e do tratamento favorecido para as empresas optantes pelo Simples. “Um mercado gigantesco como o brasileiro deve ter um certo equilíbrio entre os seus concorrentes, ao passo que também deve ter o seu limite para a preservação do ambiente concorrencial”, afirma.
Fonte: FLÁVIA MAIA / FERNANDA VALENTE
12/05/2021